ASSIM que o árbitro apitou para o final do jogo, Cris-tiano Ronaldo, que não estava muito longe da linha lateral no meio do campo, baixou a cabeça, tirou a braçadeira e foi para os balneários. Ainda levou uma palmada de con-forto de Fernando Santos, que caminhava para felicitar Didier Deschamps.
Nada, porém, servirá de consolo a Cristiano Ronaldo e companhia. Portugal não defen-derá o título de vencedor da Liga das Nações. Será a França, com a vitória de ontem, a estar na final four. A reação de Cristiano Ronaldo, porém, é um testemunho daquilo que é, hoje, a Seleção Nacional — só interessa ganhar e deixou de haver lugar a contentamento apenas por competir ao mais alto nível, satisfação por ser respeitado, animação por acreditar que o resultado até poderia ser outro, ignorando que também esteve mais perto de ser pior. Não, para Portugal, este foi um péssimo resultado, a exibição foi má durante quase 75 minutos e é bom sinal ver os joga-dores deixar o relvado carregados de frustração. Sábado, no Estádio da Luz, o melhor do mundo, o campeão do mundo, a França, foi melhor que o melhor da Europa, o campeão da Europa, Portugal.
A França foi quase sempre superior. Não terá sido, desta vez, por um qualquer bloqueio emo-cional ou complexo de inferioridade. Portugal foi aquilo que é quando joga com adversários tão bons ou melhores. Talvez, desta vez, mais dominado pela preocupação de falhar, pela preocupação daquilo que a França foi fazendo e poderia fazer, mais reativo do que ativo. Compreende-se, até, foi assim que a equipa, una e indivisível, conseguiu o maior dos sucessos. Mas há um dilema difícil de resolver — conciliar o sistema de sucesso de Fernando Santos com a natureza dos mais talentosos jogadores da equipa, como Bernardo Silva, Bruno Fernandes, João Félix e, claro, Cristiano Ronaldo.
Sábado jogaram todos com colete de força, incapazes de soltar o génio ou um sorriso, mas, seguramente, muito certinhos a fechar os espaços, a fazer as marcações. Portugal foi o que é, mas a dúvida daquilo que poderá ser não se apagará. Talvez seja injusto ou romântico pensar que se poderá ganhar de outra forma contra adversários tão bons. Sábado, perdeu-se. A França sentiu-se confortável durante quase todo o jogo, teve iniciativa de jogo, controlou a bola e o ritmo de jogo como quis, sem pres-são de Portugal, trocou-a em largura, acelerou em profundidade, encontrou em Griezmann, a jogar com liberdade e escapando a marcações, um ponto de apoio dos lances ofensivos, nos quais participaram os laterais. E foi construindo oportunidades, que foram reforços positivos para continuar a dominar o jogo. Ao contrário, as grandes defesas de Rui Patrício só intranquilizavam mais Portugal, incapaz de encontrar soluções para travar as iniciativas francesas. Já foi sempre um esforço, para Portugal, fazer mais do que três/quatro passes, levar a bola para a frente, em ataque organizado ou em saídas rápidas para o ataque, Bruno Fernandes, Bernardo Silva, João Félix e Cristiano Ronaldo recebiam quase sempre a bola de costas para a baliza de Lloris. A igualdade a zero ao intervalo não traduziu a superioridade francesa. Houve uma luz ténue de reação portuguesa assim que começou a segunda parte, mas quando Kanté marcou o único golo do jogo (54’), já a França estava outra vez por cima. Mesmo o remate ao poste de José Fonte, melhor oportunidade de Portugal, foi mais resultado de um lan-ce de fragilidade passageira da França do que de produção ofensiva consistente.
Fernando Santos mudou de sistema (para 4x4x2) com a entrada de Diogo Jota, mas foi só quando entrou João Moutinho (72’) e depois de Martial ter perdido o segundo golo que Portugal teve capacidade de acelerar a construção ofensiva, de envolver os laterais no ataque de chegar à área com bola e com jogadores para finalizar. Foi, nessa altura, com a urgência a dominar o espírito, já sem amarras, que se soltou, finalmente, o improviso dos jogadores portugueses e deu prova do que poderia fazer. É verdade, também, que a França, sabendo que até o empate com golos a favorecia, preocupou-se ainda mais com a organização defensiva e nem arriscou explorar os espaços de Portugal. E, no fim, prevaleceu, naturalmente, a melhor equipa sábado à noite.
(NUNO PARALVAS | A BOLA)