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Mercredi, le 2 septembre 2020 Journal La Voix du Portugal | 3
Journal La Voix du Portugal | 3
Fundamentalismos escondidos
como se os automobilistas fossem uma espécie soas, por via indireta, e não me refiro às restri-
JORGE CORREIA de criminosos que merecem ser extirpados da ções do covid-19, que foram necessárias, mas
A sociedade. Estamos de acordo que o automóvel, sim a políticas que restringem cada vez mais a
atualidade, com a ra-
principalmente circulando nas cidades, é uma livre circulação das pessoas, não por decreto,
dicalização de posi-
fonte de poluição, mas já se fez alguma coisa mas criando dificuldades cada vez maiores a que
ções, a predominância pela reorganização das cidades, nomeadamente se possa, por exemplo, comprar mobiliário em
da intolerância e falta de bom a descentralização ou redistribuição das zonas de Griffintown, umas roupas no centro e uns belos
senso em geral, atira cada vez cidade por forma a evitar aglomeração de circu- ingredientes no Plateau para um repasto lusitano,
mais os indivíduos para uma posição extrema lação? enquanto habito em outra zona qualquer.
de “à minha maneira ou nada feito”! Por exemplo, assistimos à modificação da cir- Esta miopia política não descortina que quan-
Este fenómeno alastra, ou melhor, alastrou a to- culação na rua St-Denis com consequente afu- do somos eleitos gerimos o bem público a bem
das as camadas da sociedade, quer sejam pessoas nilamento do trânsito por redução de faixas de de todos, não apenas da nossa base eleitoral. Há
com mais ou menos formação, mais ou menos rodagem e de estacionamento, aos quais os co- mudanças que vão exigir força política? Sim.
públicas, mais ou menos responsabilidade. merciantes da zona têm reagido, e bem, mas com Mas há modos de fazer com bom senso, ofere-
A liberdade mal compreendida e mal aplicada pouca ou nenhuma ressonância nos poderes lo- cendo alternativas de adaptação à nova realidade
leva a que ninguém compreenda que vivendo em cais, que obcecados com a bicicleta, esquecem- e com respeito por todos.
comunidade há que haver bom senso, tolerância, -se da especificidade do local, com prédios ha-
compromisso, e acima de tudo, responsabilida- bitacionais com zona de rés-do-chão comercial,
de. que implica necessariamente a circulação de
pessoas para fornecer clientela que sustente es-
Para além de ignorar as lições do passado, ve- ses comércios.
rifica-se a atual moda de governar para os pró-
prios que elegeram, usando filosofias obsoletas É curioso que assiste-se a uma defesa cada vez
com novas roupagens mas que ainda encontram mais insistente em limitar o movimento das pes-
ressonância em muitos espíritos que assim aco-
modam a eleição de verdadeiras tontices como
representantes políticos.
O fenómeno Trump é talvez o mais ilustrativo
disto. Mas não é o único. Todos os países co-
meçam a ter este reflexo de minorias que ago-
ra são maiorias, que apegados a uma ideia que
normalmente seria facilmente posta de lado, ou
pelo menos bem equacionada face às suas con-
sequências, apoiam os mais diversos disparates
que oportunamente se vão instalando na socie-
dade, enquanto que os moderados, que ainda não
se escaldaram o suficiente para reagirem, vêem
esses disparates subir de tom a cada dia que pas-
sa. Olhemos a nível autárquico, mesmo aqui na
nossa Montreal.
Que fundamentalismo é este com as bicicletas?
Nada contra elas, aliás, é um meio de transpor-
te e de recreação que gosto muito, mas não fico
confortável quando verifico a obsessão em tor-
no das bicicletas a tal ponto de prejudicar ou-
tros com os quais partilho a estrada e a vida da
cidade, como peões, comerciantes e lojistas de
toda a ordem, empresas, residentes, enfim, toda
a restante circulação.
Conheço Montreal desde há vinte anos e vejo
todos os dias piorar a circulação automóvel,