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VARIEDADE 8 | A VOZ DE PORTUGAL | TERÇA-FEIRA, 21 DE SETEMBRO DE 2021
POESIA DA SEMANA
Transforma-se o amador Lisboa, capital do nosso país
na cousa amada
Transforma-se o amador na cousa amada, JORGE MATOS O galeão foi substituído já neste século pelo mais an-
Por virtude do muito imaginar; A procura da nossa história em Portugal tigo tipo de barca usada em Portugal. A origem destas
Não tenho logo mais que desejar,
Pois em mim tenho a parte desejada. Diretor do jornal figuras remonta ao reinado de D. Afonso Henri qu'es,
simbolizando o barco que trouxe os restos mortais
Se nela está minha alma transformada,
Que mais deseja o corpo de alcançar? do mártir São Vicente desde o cabo com o seu nome,
Em si somente pode descansar, endo à capital de Portugal cidade de no Algarve, até à cidade de Lisboa. Reza à lenda que,
Pois consigo tal alma está liada. Lisboa e a única do Pais que possui ao longo da viajem, os corvos não tocaram no mor-
Mas esta linda e pura semideia, Sarmas de ouro, sinónimo de poder, to, servindo-lhe de guardiões durante o percurso. São
Que, como o acidente em seu sujeito, riqueza, nobreza e preciosidade. Vicente e hoje o padroeiro de Lisboa e os corvos o
Assim co'a alma minha se conforma,
seu símbolo. Ex-libris de Lisboa, à torre de Belém e o
Está no pensamento como ideia; monumento português mais conhecido internacional-
[E] o vivo e puro amor de que sou feito,
Como matéria simples busca a forma. mente. Foi mandada erguer no reinado de D. Manuel l,
Camões em 1514, e ficou concluída cinco anos depois. Vivia-se
O poema acima é um clássico de Luís de Ca- na altura a grande época dos descobrimentos Lisboa
mões (1524/25-1580), considerado um dos maio- era um porto importante que urgia defender.
res escritores da língua portuguesa. Transforma-se
o amador na cousa amada é composto na forma A torre foi construída com a missão de reforçar as
clássica do soneto. Aqui não há rimas e o poeta defesas da cidade dos ataques por mar. Edificada no
trata de um tema muito frequente na lírica: o amor editorial do Rio Tejo representou uma inovação da ar-
idealizado. Ao longo dos versos percebemos o quitectura militar de então, com a introdução do ba-
amor como um sentimento revolucionário, que é
capaz de fundir o sujeito que ama com a pessoa luarte, a plataforma mais baixa e avançada destinada
amada. Vale sublinhar que em Camões o eu-lírico à artilharia pesada. Francisco Arruda foi o arquitecto
almeja o amor na plenitude, isto é, ele deseja não responsável pelo projecto imprimindo na obra fortes
só a fusão dos corpos como também a das almas.
O brasão da cidade tem representado uma barra com marcas do período manuelino, que então se Vivia.
dois corvos navegando sobre um mar de sete faixas on- Um dos pormenores que evidenciam o exotismo que
OS SORRISOS DA SEMANA
duladas. A barca e realçada à prata e a coroa de ouro caracterizava a Lisboa do século xvi e o rinoceronte em
tem cinco torres, tal como os brasões das restantes ci- pedra que Arruda fez questão de incluir na torre. A es-
dades portuguesas. O brasão possui ainda à seguinte cultura representa um animal desta espécie que no ano
frase Mui nobre e sempre leal cidade de Lisboa. Estas de 1515, chegou à metrópole vindos da India.
palavras foram proferidas pelo rei D. João l como re- Depois de ter desempenhado funções defensivas à
conhecimento do auxílio prestado por este município torre de Belém serviu de prisão durante o domínio
ao reino. espanhol, a partir de 1580. Mais tarde, foi também de-
E de 1897 o documento que legitima o brasão da ci- pósito de armas. Com o passar dos séculos e devido
dade de Lisboa mas, segundo à tradição já no reine de ao assoreamento do leito do Rio, a torre aproximou-se
D. Pedro l o símbolo era um galeão com dois corvos da margem. Actualmente ponto obrigatório de visita...
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