O Espírito Santo sopra onde quer

As antigas festas imperiais do Espírito Santo, porventura as maiores do país, aconteciam em terras de Alenquer. Atraíam a presença da Corte e de forasteiros, a julgar pela dimensão das iguarias com que se faziam, por volta do Domingo de Páscoa até ao dia do Espírito Santo (Domingo de Pentecostes).

Começaram a perder importância no séc. XVIII. Reconhecidos por todos, estes festejos atribuem-se provavelmente aos franciscanos em 1323, ainda que a Rainha Isabel de Aragão e o Rei D. Dinis, seu marido, os tenham favorecido. O culto e os festejos do Espírito Santo alcançaram tão grande aceitação popular que deram origem em todo o país a inúmeras igrejas, conventos, ermidas, capelas e confrarias com essa invocação.
Os anos seguintes deram expressão às «Festas do Império» e da «Coroação do Espírito Santo» por todo o território e também pelo Portugal das descobertas, estando ainda bem vivas nos arquipélagos da Madeira e dos Açores.

Atualmente as festas do Espírito Santo decorrem um pouco por todo o arquipélago dos Açores, todas as semanas desde a Páscoa até ao Domingo de Pentecostes, em alguns casos, ou Domingo da Trindade, noutros casos. No geral, durante as festividades semanais realizam-se as “Domingas” – um misto de veneração das insígnias do Divino e de convívio alegre – e canta-se o “pezinho” ao mordomo e às pessoas que realizam generosas ofertas ao Espírito Santo. Nestes festejos podem ouvir-se cantares ao desafio semelhantes ao norte de Portugal.

Todos sabíamos que o Espirito Santo tinha residência permanente em Laval, só que a comunidade cristã de língua portuguesa desta cidade e arredores esperava a Sua manifestação : Ela nos foi concedida nos passados dias 14, 15 e 16 de junho . Sob a excelente governança da Mordoma, Sra. Helena Dias, e de uma multitude de voluntários, o Divino Espírito Santo “soprou” sobre esta comunidade cristã . Esta “aragem divina”, trouxe-se nos, este ano, uma mistura climática, visual e pastoral em vários tons : um padre novo, (Aldo Xavier) vento, chuva, sol e sobretudo a sombra escura de uma paisagem bastante contrária ao que estávamos habituados a presenciar (o nosso parque Pedro da Silva e Coreto) também eles a passarem por “ sopros” de furacão. Tudo isto, não impediu, que a participação da comunidade devota a este tipo de celebração e homenagem ao Espírito Santo, tenha arrefecido o sucesso destas celebrações . Pelo contrário : quer seja pela parte profana ou religiosa, o impulso deste “sopro” Divino, fez desta festas um sucesso semelhante ou mesmo superior aos dos anos passados.

Na sexta, dia 14, depois de uma corrida exaustiva à finalização de todos os preparativos de última instância, foi-nos servida uma deliciosa carne guizada com batata, seguida da tão esperada atuação dos “ Portuguese Kids”. A julgar pelo público (grande salão repleto até ao gargalo) e pela boa disposição de todos, não haviam dúvidas: o sopro do Divino estava connosco. Sábado, apesar da chuva e do vento dos quais fomos beneficiados abundantemente, foi posto em ação o plano “B” que consistia em transferir a animação programada do exterior para o interior do “assiadíssimo” e acolhedor salão, tão precioso e conveniente nestas ocasiões. Logo que a parte religiosa (terço e missa solene) terminaram o acolhedor anfiteatro voltou a encher e sob a conduta dos maestros da música popular DJ Alex Moreira e o conjunto StarLight, vindo de Toronto, a alegria e satisfação lia-se no rosto dos adeptos jovens e menos jovens. Como não podia deixar de ser, o caldo da meia noite veio complementar esta já bem repleta noitada. Havia que recolher e descansar um pouco, pois a festa estava longe da meta final.

Assim sendo, domingo de manhã, logo pudemos todos constatar a terceira dimenção do “sopro” Divino : Sol e temperaturas tropicais vieram confundir os incrédulos, se é que ainda havia incrédulos. Bolo de leite e cortejo pelas ruas avizinhantes da Missão na qual participaram muitas entidades politico-sociais, a nível federal, provincial e municipal.

Bem sabemos que a sua participação nada ou pouco tem a ver com as celebrações em curso, mas o facto é que tiraram um pouco do seu tempo pessoal, para nos virem calorosamente apertar a mão . Oxalá pudéssemos dizer a mesma coisa das entidades portuguesas que, supostamente se encontram neste país para servir a comunidade . (Todos sabemos que não pudemos oferecer o conforto e as ementas “ cordon bleu” dos restaurantes do “centre-ville”, ou talvez sejam as possibilidades de se confrontarem com uma clientela ou comentários desfavoráveis, não sabemos portanto, não compreendemos as verdadeiras razões destas continuadas ausências, mas como dizia o meu avô: quem não vem, não faz falta). Terminada a procissão, foi celebrada uma missa solene e logo a seguir, como manda a tradição, sopas do Espirito Santo para aconchegar os estômagos que após a longa caminhada começavam a dar sinais de desfalque.

O arraial continuou pela tarde fora animado pela bandas filarmónicas de Montreal e Laval e antes de terminar os festejos procedeu-se à escolha dos contemplados com as Domingas para o próximo ano, assim como à escolha do Mordomo para a mesma festa.

Os felizardos são os jovens que fazem parte do Rancho Folclórico e Etnográfico Estrelas do Oceano…

E a tradição continua…

TEXTO: TONY SARAGOÇA
FOTOS: HUMBERTO CABRAL